segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

O sol cega
cuspindo o fogo do presente
no olho
do horizonte
do futuro
e seca a garganta
ensurdecida pela aridez
da desrazão
da experiência rasa
do absurdo
O calor experimentado
indistintamente
abafa a abertura
do mundo a nada
Esclarecida a cidade
se apaga nas retinas
de pedestres
atravessados
pelas luzes que obscurecem
o amontoado que soterra
o sentido
do suor
do que soa
Avenidas coletivos pernas colos culos braços trabalhos
tempo máquina
vida sem instante
de chiaroscuro
E o sol cresce
iluminando as costas
e faz a gente
se abster e fugir
com as vistas
do que alimenta a vida
e a certeza
da contingência
do futuro

sábado, 15 de dezembro de 2012

O cheiro acre do trabalho
preso sobre a minha pele
sob as unhas
fundidas às fundações
enterradas em nada
Opero como um operário
afundado em um mundo
de não pertencimento
alheio ao que faço
tomo folego refaço
e levanto todo dia
um pouco
Com as mãos
pretas e carcomidas
com muitas marcas
sem identidade
tudo me é exterior
memórias
de um movimento morto
marcadas pelo anonimato
Fedo a esse trabalho
e findo
mas nele me faço
apesar do peso
de entregar o sopro
e de ser tragado
ao a-pagamento

domingo, 2 de dezembro de 2012

O cheiro de peixaria
me toma de assalto
num sobressalto
extático
me instalo no estalo
da exuberante deterioração:
do concreto
do velho
do mar
E me prostro na esquina
do estado - iluminado -
na casa cheia
de quartos
maresia ferrugem comensalidade marulho
barulho e música
agora
provavelmente vazia
talvez repleta
de pedras e sombras
Falo nas lembranças
esquecimentos
coisas que criam
nódoas
O frescor do fedor
mesmo se foi
logo que a construção começou
arruinado
Restou a
penas
este edifício de palavras
que fugaz
não tem o vigor
de peixe morto