sábado, 28 de janeiro de 2012

Ando pela madrugada cansado.
A cidade está viva como a saudade
da cigarra que se acende no cigarro
da lembrança que se mostra morta

Caminhando em círculos,
escarro
o momento do erro
e a memória do tempo
que me faz morrer de assalto

Rumino reminiscências,
seccionado
pelo presente
retardado
pelo passado
no futuro do pretérito
que teria sido

Tenho a lacuna entre os dentes
e o deleite
caído na infância
enquanto escrevo e devenho
com o poema e o cigarro
por entre os dedos

    escapando

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Isto não é um poema (sobre o jardim) ou Poema Infantil II

As moscas do jardim florido estão mortas,
posto que lhes faltam as merdas,
dos vivos que se foram, e
só deixaram a primavera,
sem amantes ou amores,
pusilânime e mórbida.

Enquanto isso, os brancos vivem,
com seus lixos queimados,
enterrados no jardim,
com alvura de livor,
e se negando a decompor,
com o porém da podridão.

Interrompe-se, assim, o ciclo
brutalmente honesto
da vida que vinga no excremento,
nutrindo a terra e alimentando
as moscas, que fazem das fezes
sua fértil morada.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Sem qualquer uivo,
uma geração enlouquece
da liberdade enlatada.
A cada palavra
se cala a vida,
seca da vitalidade que escorre
em imagens,
que dizem muito
de outrem.
Loucos e artistas
de simulacro
dissimulam e montam as peças
espetaculares
de uma auto-biografia
(comprada na esquina),
escrevendo diariamente a eternidade
da transição.
Nus nas vitrines,
no mercado de putas,
os expoentes enfeitam-se
com pele alheia, alienados
pelas experiências que lhes passam
em frente aos olhos,
em feixes fragmentários
e frêmito.
No vazio dos edifícios
construídos sobre cinzas
de cigarro,
drogas leves
e erudição barata,
o que se propaga é a solidão
compartilhada, tecnicamente
administrada
para o acúmulo.
O cúmulo é
simular
lamúrias
pelo absurdo
enquanto se ouve jazz
de olvido
sem experimentar o abismo
aberto entre solo e
harmonia, e
se abandonar à letargia
da arte
do consumo.